Iniciamos a segunda década do século XXI com uma situação nada favorável para a produção de Histórias em Quadrinhos (HQ). Esta modalidade, que praticamente está incorporada a todas as sociedades ocidentalizadas, vem atravessando uma crise em várias nações e o Brasil é uma delas. E assim como no Brasil, acontece com a Itália, a Espanha e países da latino-americanos. Só para dar um exemplo: No Brasil enfrentamos um verdadeiro tsunami de “mangás” de gosto e estilo duvidoso (HQ japonesa) cuja voracidade pelo mercado supera à da tradicional produção norte-americana.
Este problema, que apesar das características atuais não é novo, já foi brilhantemente abordado pelo catedrático chileno Ariel Dorfman e o sociólogo belga Armand Mattelart no livro “PARA LER O PATO DONALD” (Editora PAZ E TERRA), literatura obrigatória para quem aprecia HQ. Entre as diversas causas que favorecem a crise está o papel do estado que pouco caso dá para o autor e as criações nacionais, mas pensar no apóio estatal é mesma coisa que esperar ajuda dos ETs, mais ainda quando o mesmo é negligente até em áreas vitais como saúde e educação. Infelizmente não contamos com o apóio nem o incentivo como o que existe na França e na Bélgica. Lá os Quadrinhos são considerados um patrimônio cultural com todas as honras e respeito.
Mas nem tudo está perdido. Com o advento da informatização e a Internet hoje em dia é possível dar um chute na bunda a muito interesse mesquinho. Isso mesmo! E podemos não somente ser donos de todo o processo produtivo e criador, como também podemos divulgá-lo ao mundo sem depender do, muitas vezes, nefasto intermediador. Este Blog é um exemplo disto.
E para mostrar então que nem tudo é HQ japonesa ou norte-americana, vamos homenagear a produção Italiana nesta ocasião citando alguns autores que vale a pena ter em mente quando procuramos um bom HQ para ver e ler:
MILO MANARA: É um dos mais conhecidos e respeitados desenhistas de HQ italianos. Manara é mais aclamado na frança do que na própria Itália (...) tendo publicado seus trabalhos na conhecida revista HEAVY METAL inclusive. Sua temática predominante é o erotismo e algumas das suas personagens são mulheres famosas quadrinizadas, como a Kim Bassinger. Vale a pena conferir seus trabalhos, geralmente de linhas suaves, elegantes e belas mulheres esguias.
Agora, em termos de erotismo nada se compara à personagem DRUUNA de PAOLO ELEUTERI SERPIERI. Este artista já elaborara histórias ambientadas no velho oeste norte-americano, mas é com Druuna que a sua trajetória fica marcada. Druuna vive num planeta mutante e esquisito, assolado por uma doença degenerativa que ameaça a todos e onde a personagem precisa fazer de tudo (literalmente) para ajudar na produção de um soro imunizante. O desenho de Serpieri é soberbo! Rico em detalhes e precisão anatômica, com especial dedicação à opulência erótica da Druuna. Imperdível.
RANXEROX: É um personagem ímpar assim como as suas aventuras. Seus autores são STEFANO TAMBURINI (falecido por overdose) e TANINO LIBERATORE. Surgido em meio a uma crise política e manifestações de estudantes universitários, em repúdio a reformas educacionais, as histórias de Ranxerox são um soco no estômago da nossa moral. O contexto é um futuro decadente recheado de personagens corruptos, drogados, pervertidos e niilistas. Ranxerox é um robô bruto e grosseiro, mas que ama a sua namorada Lubna, viciada em heroína e com apenas 15 anos. O desenho, responsabilidade de Liberatore, é simplesmente magistral e ímpar sendo um verdadeiro divisor de águas no mundo dos comics.
MASSIMO MATTIOLI: Participou da publicação “FRIGIDAIRE” (de Stefano Tamburini) e da underground “CANNIBALE” (também de Tamburini), seus trabalhos mais cultuados são “SQUEAK THE MOUSE” e “JOE GALAXY”. Não é fácil comentar sobre estes trabalhos. Embora se trate de desenhos relativamente simples e graciosos (Mattioli segue a tradição de humanizar animais) que, no caso de “Squeak The Mouse”, até exclui os diálogos dos personagens deixando apenas as onomatopéias, a doçura termina por aí porque o resto é tudo carnificina, sangue, tripas... e sexo. É como se misturássemos num liquidificador “Sexta Feira 13”, “Despertar dos Mortos” e um filme pornô. O problema é que apesar do sadismo o desenho de Mattioli é belo e encantador, com forte colorido. Ele é o *“Haring” dos quadrinhos.
* KEITH HERING é um conhecido artista grafiteiro norte-americano já falecido.